Quando a mensagem do Cristo toca o coração de um homem ou de uma mulher, todos os valores da vida passam a ter novo significado. O martirológio que caracterizou os três primeiros séculos do cristianismo na Terra não podem ser vistos tão somente como um expurgo de Roma contra a nascente doutrina do carpinteiro galileu, ameaçando a hegemonia do paganismo em franca decadência e queda livre. As diretrizes novas penetravam os corações e as mentes, levando os adeptos aos mais comovedores testemunhos diante de feras e sacrifícios heróicos. Suas existências foram livremente colocadas a serviço da Boa Nova e eles estavam dispostos a pagar qualquer preço pela renovação moral do mundo, em soçobro da ética e da dignidade.
Suas histórias, suas biografias, hoje examinadas, se fazem incompreensíveis para grande parte do rebanho cristão. Ante a aceitação do Cristianismo por Constantino e também Teodósio, paulatinamente, os adeptos foram saindo da condição de perseguidos para perseguidores.
Anátema aos discordantes.
Fogueiras medievais aos dissidentes e reformadores.
Cruzes e excomunhão aos que não se curvassem aos ditames do papado intolerante.
Em quase 1.400 anos de história, comovedoras biografias dos mártires e de apóstolos retratam os que fizeram da mensagem de Jesus roteiro da própria vida, com Ele se imolando no mundo para triunfo junto aos filhos do calvário, lhes abrindo veredas novas onde a civilização não possui estradas.
As palavras de vida eterna, em pleno século das luzes e da cultura se afigura para alguns estranho exercício de cantochão, clamor de ascetas e anacoretas em conflitos íntimos de vulto.
A praticidade do materialismo histórico induz o ser ao olvido de sua realidade transcendente e todo seu investimento deve ser canalizado para fruição dos prazeres do corpo. A alma é simples abstração da filosofia religiosa e seu culto deve ser abandonado para que a alienação não torne o homem um fanático sem rumo e sem direção.
Para quem penetrou os divinos tabernáculos, a palavra se fez roteiro salvador e a vivência trouxe novo significado existencial.
Buscas ilusórias foram deixadas no caminho.
Adversários se fizeram ferramentas de aperfeiçoamento incessante.
Zombaria e apodo passaram à condução de estímulos para mais ardor na vivência da mensagem libertadora.
Culpa foi substituída por responsabilidade.
A fé sem obras foi descartada pelo serviço desinteressado, a crença tornou-se entendimento lúcido e os principais inimigos da existência passaram a ser as próprias imperfeições, severamente lapidadas pela paciência e pela adoção de austeridades morais.
O ser fez-se novo.
A transformação compulsória do outro passa a ser projeto sem sentido e não mais recebe investimentos no campo da convivência. A autotransformação torna-se prioridade absoluta, pavimentando a estrada para um porvir sem ilusões ou instâncias estanques no mal ou voltadas ao ócio perene dos redimidos.
O amigo de Jesus o descrucifica do madeiro infamante, O situando no íntimo por emblema e meta de vida, buscando servir e passar, passar e servir.
Sua crucificação pessoal se dá nas tarefas que abraça, nos deveres que cumpre até a exaustão das forças e no júbilo que advém da edificação de uma nova consciência, prelúdio de um tempo de renovação e paz, ansiado por sedentos de justiça e perseguidos de toda ordem.
Qualquer destaque é imerecido.
Toda cicatriz é troféu de luta.
Feridas são medalhas afixadas no tecido sensível da alma.
Lágrimas e silêncios são acompanhantes mudos na estrada do discípulo decidido a galgar o monte da própria redenção.
Não perde tempo em críticas ou se ergue na condição de juiz das vidas alheias. Se faz o amigo da senda comum, o confidente onde a amargura da multidão desamparada encontra lenitivo e a mão amiga na hora da queda provável.
Se já tens notícias de Jesus em tuas paisagens íntimas, estás comprometido com a obra D'Ele, que ainda tarda por insipiência e fragilidade do homem no mundo.
Verifica sem tardança até onde te comprometeste com César, renova teu compromisso com o Não Amado e busca atender o quanto antes teu desiderato no carreiro terrestre, consciente de que a passagem é breve, reclamando desde o ontem longínquo nossa integral adesão aos propósitos divinos, que resgatou muitos da loucura e a ti busca fazer mais do que tu pensas ser.
Não tardes. Jesus espera.
Marta
Salvador, 07.06.2022
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