
A doce e suave mensagem do Cristo parecerá, a alguns que se proclamam cristãos, distante no tempo e sem eficácia nos conturbados dias que atravessamos.
Como emprestar confiança outra vez a quem nos traiu pelas costas?
Como espalhar esperança em corações cristalizados no mal?
De que forma viabilizar o Reino de Deus entre inquilinos do condomínio das trevas?
Não seria rematada tolice apregoar virtudes entre devassos, moral em círculo de hipócritas juramentados, ética em quadrilhas de corruptos e desprendimento com avarentos?
Que localizamos nos textos evangélicos uma outra ótica na apreciação da vida, disso ninguém duvida. Que uma revolução interna se nos instalou na alma, qual vigoroso chamamento a uma renovada postura ante os desafios e lutas da craveira comum, pessoa alguma discorda.
Entretanto, daí para a frente se fazer garoto ou garota propaganda de tão revolucionário sistema de vida moral e comportamental, vai uma diferença muito grande.
Talvez se deixássemos a mensagem cristã agir por si mesma, qual a marola que beija as praias sem interferência da ação humana, tudo pudesse ser mais fácil.
Evitaríamos os costumeiros atritos ideológicos, os embates entre fé e ciência, razão e devoção cega.
Não é de hoje que os conflitos religiosos tomam conta do cenário das nações, ensanguentando as páginas da história. E o tributo que o Cristianismo pagou nos seus primeiros 300 anos de existência foram dolorosos demais para serem olvidados tão rapidamente. Ainda hoje, em pleno século da tecnologia e da astrofísica temos bolsões de antagonismos ao pensamento cristão, notadamente em países de cultura muçulmana.
Ainda persiste em muitas almas o receio de se declararem cristãs em certos lugares onde a hostilidade é manifesta, inclusive com o apoio das autoridades públicas.
Mas onde esse pensamento renovador viceja e pode ser cultivado, as barreiras são de outra espécie. A vigorosa cultura materialista criou um véu tão espesso de ilusões e valores argentários que muitos gostariam de um sistema híbrido de vida.
Prestam tributo a Jesus nas horas difíceis, mas não abrem mão da vinculação a César nas ocasiões das alegrias.
Pelejam pela conquista do Reino Divino, mas desde que o domínio terrestre esteja escriturado em cartório.
Admitem o triunfo da mensagem do Mestre nos corações, mas sem divórcio das elucubrações monetárias e sem fuga dos bens transitórios.
Oração na crise. Dinheiro e negócios quando a maré for favorável.
Frequência aos templos, buscando serem vistos pela comunidade que os anotará como assíduos aos ofícios religiosos, mas cujas mentes estarão nos folguedos e nas ocorrências de entusiasmo juvenil.
Certamente que o quadro acima não se encaixa em todos, como a carapuça do saci não se ajusta em todas as cabeças. Milhões de adeptos realmente sonham com a transformação do mundo quando as diretrizes de Jesus tocarem as almas, saindo da simples manifestação verbalística para a vivência no cotidiano de cada dia. Não transformará a sociedade de homens em anjos, nem tornará feras querubins de uma hora para outra. Revoluções íntimas reclamam tempo e paciência, devotamento e persistência para ofertarem os primeiros frutos.
Até lá...
O lobo continuará sitiando o cordeiro, o leão não se fará vegano, a serpente permanecerá silvando e lançando sua peçonha em desavisados e atrevidos.
A Terra será sacudida por estertores em suas estruturas sociais, políticas e econômicas, onde velhas construções ruirão, desabando para que se permita alargar fronteiras onde outrora erguemos muros.
Precisamos adotar intensa compreensão de que o outro não estagia no mesmo nível de evolução nosso ou dos demais. Cada consciência hoje domiciliada no planeta tem seu próprio governo íntimo, aprova decisões que muitas vezes tromba com o estabelecido pela maioria e nem sempre conseguirá digerir a mensagem renovadora.
Lê, mas não entende.
Vê, mas não enxerga.
Escuta, mas não ouve.
Percebe, mas não discerne.
Colabora, mas evita se envolver.
Se comove num momento e se faz indiferente em outro.
Nem por isso os amaremos menos.
Onde ele está e como pensa foi onde ele pôde chegar.
Igualmente, já estivemos também ali.
De quem O conhece, Jesus espera um pouco mais. De quem leu Seu diário, Ele aguarda uma decisão.
De quem O elegeu pastor não se aguarda temeridade ou atitudes impensadas. A ovelha escuta o chamado de Seu condutor e se apressa em se juntar à segurança do rebanho.
Enquanto estagia no solo áspero e difícil do planeta, tem no Mestre seu modelo e guia, mesmo que admire outros paradigmas.
Não crê. Sabe.
Não se lamenta em momento algum. Reconhece que possui mais do que merece e não espera no ócio anjos descerem das regiões felizes para o substituírem nas tarefas que lhe estão afetas.
Sua consciência, seu juiz.
Deus, o atrator para onde se dirige
A Terra, uma escola.
O outro, seu irmão ou irmã de jornada, possuindo peculiaridades que nos compete respeitar.
Teu combustível de cada dia não se encontra no posto da esquina ou na refinaria complexa. Está na fé lúcida de quem sabe o que veio fazer entre os demais companheiros de jornada.
Nada pede. Tudo que tem ou falta-lhe, é motivo de gratidão.
Se ergue muito cedo e deita muito tarde.
Suas conveniências pessoais estão sempre em segundo plano.
Avança a passos lentos, mas nunca se detém.
Com Jesus, por Jesus e para Jesus, prossiga tu!
O resto, é simples bijuteria.
Marta
Salvador, 12.08.2022