À semelhança de um escalracho profundamente nocivo, o desânimo costuma insinuar-se no terreno das almas, produzindo mal-estar e desistência do bom combate.
Surge aparentemente inofensivo, disfarçado de cansaço ante os embates da hora grave que todos atravessamos, predispondo o ser à desistência de sonhos e projetos recém iniciados, o projetando na apatia destruidora.
Ao olhar do desanimado, tudo conspira contra, cada tentame é um fracasso calculado e a meta é ambiciosa demais para dar certo. Acreditando mais na oposição do que em si mesmo, faz do tempo disponível ocupação para a lamentação e a queixa, onde dilata o pessimismo e espalha o morbo pestilento da desistência antecipada das boas obras.
O desânimo tem suas nascentes na vitimização e no complexo de inferioridade que a muitos atinge, impedindo ou dificultando o acesso a novos horizontes de possibilidades. Esvaído nas forças íntimas, o desanimado prefere o estacionamento, que nada lhe custa, ao enfrentamento de sua sombra, que o desafia a superar-se. Interpretando o papel de quem não conseguiu entender o roteiro da peça, o ator deixa o cenário onde poderia e deveria lutar para desenvolver valores intrínsecos, optando pela coxia do menor esforço e acomodando-se ao já adquirido, como se isso lhe bastasse.
Inveja o outro e suas aquisições, mas não se dispõe na movimentação das energias para igualmente alcançar o triunfo que a outrem beneficia.
Alguns fazem-se parasitas da família e dos amigos, sempre manejando argumentos e sofismas que justifiquem a perda do sentido existencial.
E casos inúmeros sugerem danosa interferência espiritual, onde mentes desequilibradas da erraticidade inoculam, de maneira sutil e imperceptível, as ondas da desistência e da acomodação do atingido na enxerga da própria pusilanimidade, estacionando o veículo evolutivo na estrada dos prazeres fáceis, minando as já débeis resistências.
Muito cuidado quando esse vibrião se insinue na casa mental, estendendo capilaridade perturbadora aos braços e à inteligência. Enérgica reação se faz necessária para que o soldado não peça baixa antecipada no quartel, fugindo ao combate contra suas próprias imperfeições.
É a Terra nossa milenar arena de lutas evolutivas, onde temos mergulhado inúmeras vezes em suas escolas de aperfeiçoamento incessante, quase sempre saindo dos cursos com pouco aproveitamento das lições ministradas. Em novas tentativas corporais, volvemos ao corpo com admiráveis propostas de luta e superação, sofrendo o assédio do desânimo e a ele anuindo, decretando a falência dos projetos longamente elaborados no invisível.
A morte corporal nos recambia de volta ao país da luz para reajuste e acerto de contas, ocasião em que uma réstia de lucidez nos dá a certeza de que o aconselhamento com o desânimo é péssima política evolutiva.
A semente encerrada na cova escura não desanima até atingir a condição de arbusto, lutando contra o solo difícil e a escassez de água. O embrião dentro do ovo tem que o dilacerar de dentro para fora, distendendo asas para sua emancipação do ninho.
No campo da alma, qualquer desânimo enseja campo fértil para a obsessão e para malogro das boas obras.
Em um momento tão grave como esse, onde uma pandemia ainda grassa na comunidade mundial, cientistas de diversos campos se afadigam em laboratórios ultra-sofisticados, buscando a erradicação do vírus destruidor. Se desistissem porque suas pesquisas não lograram êxito, que seria dos contaminados?
Se o homem do campo se desanimasse de levar os frutos da terra ao mercado, o fantasma da fome se abateria sobre milhões, estabelecendo o caos.
Se o mestre desistisse em sala de aula de alfabetizar seus alunos, a ignorância estenderia tentáculos e o conhecimento seria estancado, gerando pântanos intelectuais de difícil remoção.
E nem precisamos cogitar o que adviria para a humanidade se Deus desistisse de Seus filhos na Terra.
Percebendo a insinuação do desânimo, busca renovar tuas paisagens íntimas.
Lê uma página otimista.
Visita uma pessoa acamada.
Articula uma prece, onde possas dialogar com Deus.
E lembra-te de Jesus, que mesmo abandonado pelos amigos do colegiado, preterido pela massa tresloucada em relação a Barrabás, traído por um e negado por outro, se manteve fiel, regressando das sombras da morte para impulsionar todos à semeadura da Boa Nova.
Adotando-O como teu modelo e guia, desidrata o desânimo que busca teu cerne e, renovado nas forças e otimizado nos ideais, recomeça do ponto em que ficaste, avançando além da linha do horizonte, alçando voo como pássaro livre das incertezas e do desânimo.
Agindo assim, triunfarás.
Marta
Salvador, 28.01.2022